Gostava de começar por perguntar: quem são os jogadores jovens do Benfica, digamos, na última década, que o Benfica não aproveitou para o futebol sénior e que se revelaram depois jogadores de topo noutros clubes? Será o Sílvio? O Rui Baião? O Toy? O Brassard? Será o João Pereira que, embora reconheça nele algum valor, não é na minha opinião melhor que Maxi e nem sequer é jogador de selecção? O Deco, esse foi um erro crasso. Mas tirando esse, é que às vezes dá-me a impressão ao ler certas coisas, que aquilo no Benfica é uma cambada de incompetentes a desaproveitar miúdos que têm espalhado magia por essa Europa fora.
Ok, lembremos então agora aqueles em que o Benfica apostou ou quis apostar na última década: Hugo Leal, Manuel Fernandes, Miguel (embora vindo do Estrela da Amadora chegou ao Benfica muito jovem), Maniche, Jorge Ribeiro. O que é que é comum a estes jogadores que mencionei? Todos eles saíram do clube a mal, todos eles forçaram a saída do clube, todos eles saíram do Benfica por valores que não correspondiam ao seu real valor.
Evidentemente eram jogadores novos, ambiciosos, a dar os primeiros passos no futebol profissional, contratos baixos, empresários ávidos de sucesso, todos eles fizeram valer as artimanhas dos contratos, que baseado depois nos ordenados baixos e nos anos de formação, acabam por sair por tuta e meia. O Maniche por exemplo, assinou contrato com o FCP estava ainda no Benfica e o Benfica a tentar renovar contrato com ele. Simplesmente, ele já sabia que não ia renovar contracto porque o empresário Paulo Barbosa tinha outros planos. Foi castigado e jogou pelas reservas e Jorge Ribeiro seguiu o mesmo caminho.
Isto para dizer o quê? Que é muito bonito falar na aposta nos jovens jogadores do clube, quando a verdade é que os maus ficam sempre e os bons arranjam sempre forma de sair à primeira oportunidade, seja a bem ou a mal. Já Wenger dizia, isto para lembrar os saudosistas do amor à camisola:
“If you are a great player you want to play with great players. If you are a great musician you want to play in an orchestra with great musicians. If you offer the guy the chance to play in an orchestra with poor musicians, he will not be happy.”
A mensagem é óbvia: Amor à camisola?! Onde é que isso já vai. Quando as oportunidades surgem, quando emblemas de topo acenam a um jovem com contratos milionários, estatutos de estrela e vidas de luxo, como é que se segura um jogador assim? Ou alguém acredita que se fosse nos tempos de hoje, jogadores como Coluna, Eusébio, Shéu ou Nené também fariam carreira na Luz? O amor à camisola era apenas um sinal dos tempos, convençam-se disso. Era assim naquela altura.
Os casos mencionados revelam logo um problema: O Benfica aposta num jovem que entra na equipa com um contrato baixo e de curta duração, o clube corre o risco de lhe dar uma hipótese ao mais alto nível, são jogadores imaturos que precisam de cometer erros para crescer, os erros custam pontos, os pontos custam campeonatos, muito dinheiro e cabeças de treinador mas, admitindo que uma aposta até se tenha justificado acertada e o jogador revele condições para outros voos (talvez um em cada dez), como é que se segura o jogador depois? Quando o empresário já tem outros planos, quando o jogador já ouviu falar de propostas de meia Europa, e renovar não o faz a não ser por valores insustentáveis? Andou então o Benfica a formar jogadores para outros usufruírem dele? Infelizmente isto não é ficção, no Benfica aconteceu mesmo e mais do que uma vez. Será a alternativa apostar-se apenas em jogadores que já tenham contratos de cinco anos e cláusulas de rescisão de trinta milhões? Mas e se não tiverem valor? Se não tiverem valor aparecem os mesmos críticos, aqueles que criticam a falta de aposta na formação, e que depois iriam criticar a cambada de burros que aposta em jogadores jovens sem qualidade que ficam a viver cinco anos à conta do clube.
Agora podem perguntar: pois então se apostar nos jovens dos juniores acarreta riscos, nomeadamente o facto de serem jogadores mais propícios ao erros, e que qualquer treinador em Portugal com um mínimo de bom senso e sabedor que luta pelo seu lugar domingo a domingo não pode correr, qual a diferença então em apostar em jogadores Argentinos ou Brasileiros que chegam à Luz muito novos na mesma?
Desde logo uma grande diferença: normalmente chegam novos mas já com experiência de um, dois ou três anos de futebol sénior nos seus países, já têm algumas provas dadas, são mais do que promessas já com clubes atrás deles, têm maior margem de tolerância juntos dos adeptos (o que no Benfica é um factor importantíssimo) e já assinam pelos clubes que os contratam por valores adequados ao seu valor e com contratos de longa duração, cláusulas de rescisão elevadas, estando por isso mais protegidos quanto às vontades dos empresários.
Outra pergunta que gostava de fazer? Quem são os clubes de dimensão que fazem da formação uma aposta mais séria? Diria quatro, assim de repente: Ajax, Auxerre, Sporting e Barcelona. Tirando o Barcelona, quantos dos jovens talentos dessas equipas fazem carreira no clube? Quantos títulos têm valido recentemente aos clubes que os formaram? Quantos saíram pelo valor adequado? Quantos jogos fez no Sporting Ronaldo, Quaresma, ou Hugo Viana? Podia também falar no Arsenal… Que ganhou o Arsenal nos últimos cinco anos? Um redondo zero. Quantos jogadores formou? Dezenas deles, formou por exemplo Hleb e Flamini, pedras basilares da equipa que saíram a custo zero para Milan. Saíram porque o Arsenal se recusou a pagar o que pediam.
A excepção é obviamente o Barcelona, e as razões são óbvias: se o Barcelona tiver talento nas suas escolas, sabe de antemão que não corre o risco das suas pérolas serem assediadas por clubes maiores. Quem é do Barcelona fica no Barcelona, é pago pelo seu real valor, e não tem pretensões de sair para um clube superior que não existe.
Em Inglaterra por exemplo, ainda este ano, para proteger o futebol formação e a própria selecção, os clubes tiveram de apresentar nos seus planteis um mínimo de oito jovens que antes dos 21 anos tenham estado três anos em Inglaterra ou País de Gales, e ao mesmo tempo limitou o número de jogadores dos plantéis a 25 jogadores.
Sabem qual foi a primeira consequência prática desta política? A primeira é que o valor comercial dos poucos jovens talentos ingleses duplicou. E a segunda aconteceu no Manchester City que por já ter 25 jogadores inscritos e pretender contratar Balotelli, decidiu dispensar Stephen Ireland. Só que ele não queria sair. E como não queria sair exigiu dois milhões de libras para se ir embora. Ou seja, as tais políticas novas, e para aqueles que condenam o futebol moderno e o papel dos empresários, faz com que os jogadores exijam dinheiro para assinar e depois mais dinheiro para sair dos clubes.
Quero com isto dizer que não se deve apostar na formação? De maneira nenhuma, simplesmente pretendo alertar para alguns problemas especialmente nos grandes clubes em que a exigência é máxima.
Salvo raríssimas excepções, entendo que os jogadores jovens devem ser emprestados, ganhar experiência e revelarem-se bons jogadores em clubes de menor dimensão, e então sim, renovarem-se contratos por valores adequados antes de chegarem à casa mãe e serem apostas certas.
O futebol actual e o grau de exigência de um clube como o Benfica não se adequa à cultura do erro. No Benfica não há tempo para ter tempo – como dizia Toni. O que um treinador do Benfica precisa, para mais sabendo que na Luz não se resiste a duas derrotas seguidas, é de jogadores que cheguem prontos para corresponder.
Porque raio vai um treinador do Benfica apostar em jogadores com tudo para aprender, sabendo de antemão que em 90% das vezes, nenhum treinador fica lá mais do que um ano?
É a isto é que eu gostava que me respondessem.
E dois excelentes posts no dia de hoje:
Gestores Profissionais VS Presidentes de Clube, por GB
Fifa, governante ou desgovernante do Futebol Mundial?, por Darthvader
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